Seminário Diversidade e Equidade no Setor de TI no Brasil: Perspectivas sobre o Trabalho e Inclusão Digital, realizado na sexta-feira, 11, de forma online pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) debateu o histórico de desigualdades neste campo, com foco na questão de gênero, os desafios da inclusão e participação digital na sociedade e no mercado de trabalho.
“As empresas precisam garantir a diversidade de gênero e raça e é necessário que essa inclusão ocorra dentro das empresas e que essas pessoas tenham mobilidade para chegar no topo da carreira”, disse a presidente da organização Geledés e pós-doutoranda em Diversidade Étnico-Racial na Universidade de São Paulo (USP), Antonia Quintão. “Algumas vezes empresas se apresentam como organizações comprometidas com a diversidade, porém os postos de decisões, os cargos mais estratégicos, aqueles cargos que poderiam garantir efetivamente a representatividade para fazer a diferença, não são ocupados por negros, quase nunca por mulheres negras.”
Ela destacou que os negros representam 30% da população brasileira e, como grupo mais numeroso, incluir mulheres negras é fundamental. “Não se pode falar que existe diversidade quando nós não estamos devidamente representadas, não é possível afirmar que existe diversidade então quando existem apenas duas ou três mulheres negras [na empresa]”.
Antonia foi uma das participantes do Seminário Diversidade e Equidade no Setor de TI no Brasil: Perspectivas sobre o Trabalho e Inclusão Digital, realizado na sexta-feira, 11, de forma online pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O evento debateu o histórico de desigualdades neste campo, com foco na questão de gênero, os desafios da inclusão e participação digital na sociedade e no mercado de trabalho, além de discutir iniciativas para o aumento dessa inclusão.
Para ela, é preciso que, no ambiente organizacional, haja uma mudança de paradigma e que todos os funcionários, principalmente aqueles que decidem, entrevistam, selecionam e fazem as contratações, reflitam sobre as relações sociais no Brasil e sobre os seus próprios preconceitos. “Fazer discurso a favor da diversidade é importante, mas implementar a diversidade é que vai fazer a diferença, então é preciso aprender, ou melhor, desconstruir os preconceitos que temos nesse racismo estrutural que atravessa todos nós, desconstruir e ao mesmo tempo investir na capacidade, no talento, na competência da juventude negra, das jovens negras”, disse.
Antonia destacou que a desigualdade de oportunidades é uma das manifestações do racismo no país. “Nossa sociedade é marcadamente racista, nós estamos falando do racismo estrutural, que é aquele que atravessa todas as áreas, todos os setores, todos os segmentos da sociedade, e não reconhece a população negra no campo da igualdade”.
Exclusão digital
O racismo é apontado pela doutoranda em Ciência da Computação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), com foco em Gestão da Diversidade, Biamichelle Miranda, como um dos principais desafios enfrentados por mulheres afrodescendentes e outras parcelas da população socialmente excluídas da tecnologia. “No caso da diversidade étnico-racial, eu ouso a dizer que mesmo no nível celular [familiar], mesmo no nível institucional, seja na academia ou nas organizações públicas e privadas, o nosso principal desafio ainda é o racismo. Porque o racismo vai ditar a questão da nossa educação, o atraso na nossa educação, e é por isso que a gente fala sobre cotas, o racismo vai ditar o porquê somos tão poucos dentro da área da TI [tecnologia da informação], porque não é de agora”, disse.
Biamichele contou que ensina programação para jovens em situação de vulnerabilidade social na periferia de Porto Alegre. “Já teve jovens dentro da minha turma que estavam em abrigos, que tinham problemas muito maiores, que já iam completar 18 anos, precisariam ter uma casa e ainda não tinham. E como é que aquele jovem se concentra, como é que ele se concentra para aprender Java Script, sendo que ele não sabe aonde ele vai dormir daqui a uma semana quando completar 18 anos?”.
Segundo ela, as principais mudanças devem ser feitas no nível estrutural e isso só poderá ser feito de maneira coletiva. “E aí é entender que todas as medidas que a gente vai fazer no nível individual para enfrentar esses desafios podem ainda ser insuficientes porque a gente precisa, assim como o racismo esculpe [marcas] na gente, a gente precisa esculpir também nessa sociedade como a gente vai enfrentar isso, e isso são mudanças profundas, que não se faz no nível individual”.